A ESTRATÉGIA DE RH

Há alguns bons anos atrás, quando iniciava minha carreira dentro de instituições, atuei como estagiária em RH de uma empresa grande, com um setor de Recursos Humanos igualmente gigante.

A empresa passava por uma reestruturação interna ao longo de 03 anos e finalmente as mudanças chegavam ao setor de RH.

A primeira pergunta que todas as equipes fizeram à Gestora foi:

“Haverá corte de pessoal em nosso setor?”

 

Por meses as respostas mudaram e seguiram um tipo de ‘crescente’:

·         Ainda não tenho informações mais claras;

·         Acredito que nossa estrutura atual esteja adequada;

·         Farei de tudo para que isso não aconteça.

E foi em uma reunião geral, com os integrantes das equipes de RH (matriz e filiais) que nossa Gestora, depois de uma discussão calorosa, cedeu à pressão e respondeu oficialmente:

“Ninguém será demitido”

 

Lembro de sentirmos um alívio tão grande que em plena segunda-feira alguns colegas decidiram se reunir para um happy hour.

Bem, não preciso explicar o tamanho da surpresa no dia seguinte (sim, no dia seguinte) quando tive que me despedir de 02 colegas de trabalho.

Nossa Gestora alegou ‘ordens superiores’ para justificar a ‘omissão’ e desta maneira dividiu opiniões, recebeu críticas, alguns pedidos de demissão, bem como, permaneceu em ‘retiro’ por meses, sem promover reuniões. Ou seja, um ‘efeito dominó’ difícil de contornar.


Me perguntei: não haveria outro caminho?

 

O fato é que as energias de um Recursos Humanos permeiam 03 diferentes (e por vezes contrárias) frentes:

·         As solicitações e expectativas dos Sócios

·         As solicitações e expectativas dos empregados

·         E os próprios projetos e expectativas como RH


Por acaso já te sentisse alguma vez? Com a necessidade de atender ora uma, ora outra frente que parecem buscar objetivos divergentes?

Se sim, saiba que há uma maneira mais coesa e unificada de desenvolver o teu trabalho.  E ela é mais simples do que parece.

 

ESQUECEMOS DE ALGO IMPORTANTE

O Recursos Humanos nasceu especificamente para racionalizar e entender as variáveis que influenciam a produtividade de funcionários. E desta maneira, gerar mais resultado para a empresa (modelo industrial).

Com o passar do tempo e evolução dos modelos de trabalho, deixamos de oferecer somente ferramentas de administração do capital humano para oferecer também práticas de desenvolvimento de pessoas.

O fator humano tornou-se ‘o bem mais valioso’ de uma instituição. Passou de ‘mão-de-obra produtiva’ para o recurso que proporciona vantagem competitiva. E ao invés de um processo administrativo de pessoas agora atuamos com a Gestão Estratégica de pessoas.

 

Mas será que conseguimos na prática?

 

Se ainda não conseguimos conectar e equilibrar o foco entre empregador e empregado, já que somos um dos principais elos entre estes interlocutores, asseguro que o nosso papel é nomeado, mas não efetivo no papel de estratégico.

Inúmeras ferramentas, estudos científicos, formações especializadas e cada vez mais, um lugar à mesa de reuniões estratégicas, tudo isso já existe (em suas devidas proporções de acordo com a instituição). E mesmo assim, temos dificuldade em atender de maneira integralizada empregador e empregado. Atuamos mergulhados neste paradoxo de interesses, que inclusive contribui para sua consolidação.

 

Tudo isto porque esquecemos de algo importante: MUDAR O OLHAR. 


A VERDADEIRA VANTAGEM COMPETITIVA

 

“Para os indivíduos, caráter é destino. Para as organizações, cultura é destino.” – Tony Hsieh –

A vantagem competitiva não se resume às pessoas, mas sim a cultura da instituição.

E do ponto de vista da Psicologia Institucional a cultura basicamente se legitima através do conjunto de relações sociais que reproduzimos e repetimos (explícita ou implicitamente).

Ou seja, a cultura não é formada somente pela missão, valores e práticas de uma empresa. Mas sim, por aquilo que é efetivamente reproduzido, a ação, o comportamento das pessoas que compõe aquela empresa.


E quando eu falo pessoas, eu quero dizer todas as pessoas, incluindo sócios, clientes, o RH, todos que de alguma forma participam da dinâmica relacional de uma instituição. Até mesmo a rádio peão faz parte da cultura de muitas empresas.


Perceba que as características que emergem de todas estas conexões entre as pessoas são tão complexas e únicas que é quase impossível replicá-las. Ou seja, se olharmos para estas conexões a fim de equilibrá-las, potencializá-las e enxugá-las de diferenciais de mercado, é quase impossível ser ‘copiado’. Pode (e deve) se tornar a verdadeira vantagem competitiva de uma instituição.


Está aqui um dos maiores segredos de uma atuação realmente estratégica: olhar para dinâmica dos grupos e fortalecer uma cultura competitiva.

 

Mas para isso tudo tu precisas conhecer muito bem que cultura é essa que tu queres fortalecer.


**Se quiser conhecer um pouco mais sobre o poder da Cultura Institucional, eis uma dica de leitura fantástica: Livro “Satisfação Garantida: no caminho do lucro e da paixão” – Tony Hsieh – Rio de Janeiro: Tomas Nelson Brasil (editora)

 

A ESTRATÉGIA ESTÁ NA MANEIRA DE PENSAR

A Psicologia Institucional (termo cunhado por José Bleger, psiquiatra argentino) é muito mais uma ‘Estratégia de Pensamento’ do que uma área específica de atuação. Por isso, acredito que qualquer líder verdadeiramente interessado em atuar estrategicamente pode usar e se beneficiar desta ferramenta.


Esta ‘Estratégia de Pensamento’ aproxima-se muito ao que popularmente chamamos de ‘visão sistêmica’, mas focalizada nos grupos e em suas relações.

Trata-se de coletar informações, planejar estratégias e atuar a partir da referência das dinâmicas grupais, no alcance de seu equilíbrio e coerência com o propósito institucional.

Lembra da história que contei no início? Onde minha Gestora ‘omitiu’ informações em prol de ‘ordens superiores’?


Se olhássemos para esta situação com a ‘Estratégia de Pensamento’ Institucional perceberíamos que se trata nada mais nada menos do que uma prática cultural da empresa. É claro, uma prática insalubre de omitir informações e fazer sentir subjugados desde empregados até o próprio RH.


Esta característica estava tão enraizada nesta identidade cultural que os empregados respondiam a esta dinâmica com pressão e reivindicação de informações.

Além disso, os próprios empregados repetiam esta mesma dinâmica entre si: caracterizado pela própria omissão da nossa Gestora de RH. E, provavelmente, a mesma dinâmica se repetia com fornecedores e clientes, o que não é nem de longe um bom sinal.


Quando olhamos desta maneira mais integralizada e conectada para os fatos, conseguimos ir muito mais além do que o paradoxo Empresa X Empregado. Conseguimos perceber o que está escrito nas ‘entrelinhas’ e planejar uma atuação verdadeiramente estratégica.

Ou seja, que proporcione uma mudança na cultura (mesmo que em diferentes níveis) capaz de gerar vantagem competitiva para a empresa e, o melhor de tudo, proporcione também equilíbrio e saúde para a instituição.


COMECE POR VOCÊ

Se você faz parte da instituição, é natural que não só consiga observar e citar situações incongruentes, como também consiga sentir e viver estas incongruências.


Os grupos tendem a manter um padrão de comportamento que caracteriza sua identidade.


Como RH interno tu compões este grande grupo e consequentemente reproduz, mesmo que em um nível diferente, esta identidade.


Te convido a fazer um simples exercício para treinar esta ‘Estratégia de Pensamento’.

Analisa teu setor e identifica como ocorrem as dinâmicas de relacionamento com os teus diferentes clientes internos.

·         Existem pontos de incoerências?

·         Sentes desconforto ou dificuldade no manejo de algumas relações ou projetos específicos?

·         Quais os principais motivos para estas incoerências?

·         Existem pontos de coerência?

·  Sente-te confortável e muito à vontade no manejo de algumas relações ou projetos específicos?

·         Quais os principais motivos para estas coerências?

Todas estas respostas podem te dar subsídios para identificar dois pontos importantes:

  • Que tipo de DNA positivo a tua instituição possui (coerências);
  • Que tipo de mudanças estratégicas precisam ser realizadas (incoerências).

Esta auto percepção já é um grande exercício e começo.

Afinal, se queremos contribuir com mudanças estratégicas e saudáveis, que elas iniciem por nós mesmos, pelo nosso setor.


RECAPITULANDO

Somos o principal elo entre Empregador e Empregado, e apesar de sermos nomeados como ‘setor estratégico’ pecamos em uma questão anterior à estratégia: a de integralizar o foco destes interlocutores.

Por isso, acabamos por dividir nossas energias em 03 diferentes (e por vezes contrárias) frentes:

  • As solicitações e expectativas dos Sócios
  • As solicitações e expectativas dos empregados
  • E os próprios projetos e expectativas como RH

Mas através de uma ‘Estratégia de Pensamento’ diferente é possível direcionar estas energias e tornar nosso trabalho mais coeso, unificado e verdadeiramente estratégico.

O segredo está em focar a atenção nas dinâmicas grupais e ‘ler’ o que emerge da cultura institucional.


Quanto mais o comportamento dos grupos (a cultura) estiver congruente com o propósito da instituição, mais estratégica será a gestão de pessoas.


Quanto mais o comportamento dos grupos operar de maneira saudável e equilibrada (sem corroer a saúde emocional ou física dos envolvidos), mais motivador será o ambiente de trabalho.


Então, que tipo de mudanças posso propor para promover tudo isto?


Ao observar estas congruências e incongruências que se torna possível planejar e atuar de maneira realmente estratégica: atuar em mudanças (pequenas ou grandes) na cultura institucional.


Podemos sim ser mais estratégicos!

Basta focalizarmos um pouco mais o nosso olhar na instituição como um todo e utilizar uma ‘Estratégia de Pensamento’ mais integralizada, capaz de se conectar com a verdadeira vantagem competitiva de uma instituição: uma cultura coerente e equilibrada